sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Oligarquia Sarney impede que a revista ISTOÉ chegue ao Maranhão



Para quem ainda não viu, abaixo, segue a reportagem da revista.

Os hospitais de Roseana na UTI

Por Claudio Dantas Sequeira, Da ISTOÉ

Fraudes em licitações colocam sob suspeita programa de construção de unidades de saúde da governadora do Maranhão, em um negócio de quase meio bilhão de reais.


ESCÂNDALO: Relatório da Procuradoria de Contas aponta irregularidades na licitação e pede a devolução de repasses feitos a empreiteiras



Quem percorre o interior do Maranhão se surpreende com a quantidade de esqueletos de grandes obras abandonadas e expostas ao tempo. Várias delas estão em municípios humildes como Marajá do Sena, Matinha e São João do Paraíso. São hospitais públicos inacabados do programa Saúde é Vida, principal bandeira da campanha de reeleição de Roseana Sarney (PMDB). Com apenas 12% do cronograma cumprido desde que foi lançado há dois anos, o projeto já tem um custo superior a R$ 418 milhões e corre o risco de virar mais um imenso monumento à corrupção. Relatório da Procuradoria de Contas maranhense, obtido com exclusividade por ISTOÉ, acusa o governo de fraudar o processo licitatório, pede a devolução de parte dos repasses e a aplicação de multa ao secretário de Saúde, Ricardo Murad, cunhado da governadora. A investigação dos procuradores Jairo Cavalcanti Vieira e Paulo Henrique Araújo, a partir de representação do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Maranhão, revela um cipoal de irregularidades e mostra como o governo beneficiou empreiteiras que depois abasteceram o caixa de campanha do PMDB com mais de R$ 2 milhões.


DENÚNCIA: documento cita empresas envolvidas


Os problemas começaram no segundo semestre de 2009, quando o governo de Roseana resolveu lançar o Saúde é Vida. Mesmo sem previsão orçamentária, a governadora conseguiu incluir o programa no Plano Plurianual e entregou sua execução ao cunhado. Murad, alegando urgência, contratou sem licitação a empresa Proenge Engenharia Ltda. para a elaboração dos projetos básico e executivo. Os procuradores descobriram que, na verdade, o projeto básico já tinha sido elaborado por técnicos da própria Secretaria de Saúde. A mesma Proenge venceu, logo depois, um dos lotes da concorrência 301/2009 para a construção de 64 hospitais de 20 leitos. O edital da obra indicava que as empreiteiras vencedoras deveriam elaborar o projeto executivo dos hospitais. Ou seja, a empreiteira acabou recebendo duas vezes para prestar o mesmo serviço. No total, a Proenge recebeu R$ 14,5 milhões. Para os procuradores do TCE maranhense, que questionam o caráter emergencial da contratação, “os valores pagos à empresa Proenge constituem lesão ao erário e devem ser objeto de ressarcimento”. Eles calcularam em R$ 3,6 milhões o total que deve ser devolvido.






As ilegalidades não param aí. A construção dos hospitais de 20 leitos foi dividida em seis lotes, mas três deles simplesmente não entraram na licitação. Foram entregues a três empreiteiras diferentes: Lastro Engenharia, Dimensão Engenharia e JNS Canaã, que receberam quase R$ 64 milhões em repasses e nem sequer construíram um hospital. A JNS Canaã é um caso ainda mais nebuloso. Os procuradores afirmam que a empreiteira, filial do grupo JNS, teve seu ato constitutivo arquivado na Junta Comercial do Maranhão em 24 de novembro de 2009, dias antes de fechar contrato com o governo. A primeira ordem bancária em nome da JNS saiu apenas quatro meses depois, em 16 de abril de 2010. Sozinha, a empresa recebeu R$ 9 milhões, não concluiu nenhum dos 11 hospitais e teve seu contrato rescindido por Murad. Antes, porém, a mesma JNS doou R$ 700 mil para a campanha de Roseana, por meio de duas transferências bancárias, uma de R$ 450 mil para a direção estadual do PMDB e outra de R$ 300 mil para o Comitê Financeiro, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral.




FAVORECIMENTO: Roseana e Ricardo Murad (à esq.), em inauguração de hospital: eles beneficiaram empreiteiras.



A Dimensão Engenharia e Construção Ltda., outra das contratadas sem licitação, foi ainda mais generosa ao injetar R$ 900 mil no caixa do partido durante a eleição. A Lastro Engenharia, por sua vez, repassou aos cofres peemedebistas mais R$ 300 mil. A empresa conseguiu dois contratos com dispensa de licitação: a reforma do Hospital Pam-Diamante, em São Luís, e a construção de hospitais de 20 leitos. Além disso, foi uma das vencedoras da disputa (licitação número 302/2009) para erguer unidades de saúde com 50 leitos. Esses contratos foram aditivados em 25% (o limite legal previsto pela legislação). Ao todo, a empreiteira faturou R$ 58 milhões. O uso do limite para elevar o valor dos contratos foi utilizado também por outra construtora, a Ires Engenharia, o que alertou os procuradores do TCE. “Chama a atenção o fato de o valor acrescido aos contratos coincidir até nos centavos com o valor limítrofe previsto em lei. A impressão que se tem é que ou o valor originariamente contratado foi equivocado ou os aditivos foram firmados sem critério estritamente técnico”, escreveram no relatório.



Para o deputado Domingos Dutra (PT), os problemas no programa Saúde é Vida vão além do anotado pelos procuradores. Um levantamento das ordens bancárias de 2010 mostra uma série de repasses redondos que, segundo Dutra, “indicariam a prática de caixa 2 para abastecer a campanha de Roseana.” A Dimensão Engenharia, por exemplo, recebeu R$ 1 milhão em 19 de julho. Três dias antes, a empreiteira Console apresentou fatura de R$ 2 milhões. No mesmo dia, o governo pagou mais R$ 1 milhão à Geotec e R$ 1,5 milhão à Guterres, que no dia 22 recebeu mais R$ 500 mil. A JNS teve três repasses redondos: R$ 300 mil e R$ 50 mil em 16 de abril e R$ 1,5 milhão em 16 de julho. A Lastro teve um repasse de R$ 1,5 milhão; a Proenge, dois repasses de R$ 600 mil e R$ 300 mil; e a Ires Engenharia, um pagamento de R$ 1 milhão. “Nenhuma empresa emite nota fiscal pela prestação de serviços com números redondos”, afirma Dutra. “Geralmente são valores fracionados, até em centavos, como vemos nas dezenas de outras ordens de pagamento.” O parlamentar encaminhou petição ao Ministério Público Federal e à Controladoria-Geral da União.
Além dos indícios de corrupção e do uso das obras para angariar dividendos políticos, o deputado federal Ribamar Alves (PSB) ataca a concepção do Saúde é Vida, que, segundo ele, contraria determinações do próprio Ministério da Saúde sobre a construção de hospitais em cidades com menos de 30 mil habitantes. “Essas prefeituras não têm dinheiro para a manutenção desses hospitais nem médicos suficientes ou demanda”, afirma. Ele estima em R$ 500 mil o custo mensal para a manutenção dessas unidades, valor acima da soma dos repasses do Fundeb, do SUS e do Fundo de Participação dos Municípios. “Sem gente nem dinheiro, esses hospitais vão se transformar em imensos elefantes brancos”, diz Alves. O parlamentar lembra que a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara aprovou requerimento do deputado Osmar Terra (PMDB/RS) para convidar Murad a prestar esclarecimentos sobre o programa e outros problemas na área da saúde. “Ele tem muito o que explicar”, afirma. Procurado por ISTOÉ, o secretário de Saúde do Maranhão não se manifestou até o fechamento da edição.







P.S.: Aqui - internet - eles ainda não mandam (ou mandam?), portanto, repassem, para que o povo maranhense, conheça um pouco mais da sua “grande” governadora.







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Reutmann Santos

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Piso Salaria Nacional dos Professores

Com professores em greve, estados ainda lutam contra piso salarial

Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Ceará entram no Supremo Tribunal Federal (STF) com ações para adiar pagamento de piso salarial a professores do ensino público. Lei foi julgada constitucional em abril e sentença foi publicada em agosto. Confederação de professores promete mobilização em dez dias para pressionar estados e municípios.

BRASÍLIA – Com milhares de professores em greve pelo país e prometendo novas manifestações, quatro estados recorreram de novo ao Supremo Tribunal Federal (STF) no caso da lei que fixa piso salarial de R$ 950 para o magistério básico da rede pública. Derrotados ao tentar derrubar a lei, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Ceará querem agora que a corte diga a partir de quando devem se enquadrar. Para isso, entraram com ação chamada de “embargo de declaração”.

Os mesmos quatro estados são autores de ação ajuizada no STF em outubro de 2008 que buscava cancelar a lei, por suposta afronta à Constituição – o Paraná também estava naquele grupo, mas não entrou com embargo agora.

O Supremo julgou a ação, em caráter definitivo, em abril deste ano: a lei é constitucional. Publicou a sentença, conhecida como acórdão, dia 24 de agosto. Os estados tinham até essa segunda-feira (05/09) para contestar o acórdão.

Os governadores de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD), do Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB), e do Ceará, Cid Gomes (PSB), esperam que o STF afirme que a lei vale a partir de agora, depois da publicação da sentença. O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), quer a vigência da lei só daqui a 17 meses.

A lei foi sancionada em julho de 2008 e diz que tinha de ser cumprida na íntegra a partir de janeiro de 2010. Ou seja, havia um tempo de adaptação. O governo gaúcho entende que essa transição deve começar a contar só agora, que a lei foi julgada constitucional.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), contudo, reivindica que o piso seja pago retroativamente a abril, quando o STF julgou a ação. “Esta é mais uma tentativa dos governos estaduais de protelarem o cumprimento da lei que já deveria estar valendo integralmente desde 2008”, disse o presidente da entidade, Roberto Leão

O sindicalista reclama, em particular, da ação do Rio Grande do Sul, que seria o mais “retrógrado”, apesar de o governador Tarso Gerno ter sempre se declarado favorável à lei.

O governo gaúcho diz, porém, que a posição não mudou e bota culpa na antecessora, Yeda Crusius (PSDB). “Nós assumimos um compromisso com o piso nacional, desde que pudesse ser pago de forma escalonada. O Rio Grande do Sul possui cerca de 130 mil professores. Não temos como absorver todo este impacto no nosso orçamento. O Estado está quebrado”, disse o secretário-chefe da Casa Civil, Carlos Pestana.

De acordo com ele, apenas 5% da categoria recebe menos do que o piso nacional. “O que estamos discutindo é o tamanho do impacto deste aumento na carreira dos professores, que implicará em investimentos de mais R$ 2 bilhões na folha de pessoal. Quando assumimos, a diferença entre o piso regional e o piso nacional era de 66%. Agora, já foi reduzida para 51%”, justifica.

Mapa da ilegalidade
Segundo a CNTE, nenhum dos 27 entes federativos cumpre inegralmente o que determina a lei do piso do magistério. A entidade diz que já houve greve em nove estados este ano. “Em Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Goiás, Rio Grande do Norte, Paraíba, Maranhão, Ceará, Rondônia e Amapá a lei é completamente ignorada”, disse Leão.

Em Minas Gerais, a greve já dura três meses e paralisa 50% das escolas do estado, conforme cálculos dos sindicalistas. O governador Antonio Anastasia (PSDB) diz, em propagando oficial, que, no máximo, 30% dos professores estão fora das salas de aula.

No Ceará, a greve já extrapola um mês, apesar da Justiça tê-la julgado ilegal e determinado multa de R$ 10 mil por dia no caso do descumprimento da retomada imediata das aulas.

Segundo os educadores, o governador Cid Gomes (PSB) disse, durante as negociações, que “por ele, professor não tinha carreira, que ser professor é um sacerdócio”. Questionado pelo jornal local O Povo, Gomes se defendeu: “quem entra no serviço público precisa fazer seu trabalho por amor, e não pelo dinheiro”. Os professores criaram imediatamente a campanha "Cid Gomes, seja governador por amor - doe seu salário".

Agenda de lutas
Os quase 2 milhões de professores do ensino básico, representados pela CNTE, definiram uma ampla agenda de mobilizações para garantir a aplicação do piso nacional. No próximo dia 16, entregarão a prefeitos, governadores e autoridades educacionais os abaixo-assinados colhidos em todo o país em apoio à lei.

Também pretendem lançar um concurso nacional de desenho com o tema “10% da Educação para quê?”, em referência à campanha nacional protagonizada pelos movimentos sindicais e sociais do país em prol da destinação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a área. “Pretendemos pautar a discussão sobre o financiamento da educação em todos os cantos do país”, acrescentou Roberto Leão.

Conforme ele, nesse mesmo dia, os professores irão dedicar as duas últimas aulas a um amplo debate sobre o tema nas salas de aula. “Queremos que nossos alunos reflitam sobre a importância de se investir em infra-estrutura, em pagamento de pessoal e na garantia de um ensino de qualidade para todos”, acrescenta. Para o dia 26 de outubro, eles planejam uma grande marcha, em Brasília, cujo mote é “10 mil pelos 10%.

Valores divergentes
Em 2008, quando foi sancionada pelo presidente Lula, a Lei 11.738 estipulava R$ 950 como valor para o piso nacional da categoria. O Ministério da Educação (MEC) defende que, hoje, este valor deve ser reajustado para R$ 1187. A CNTE, porém, calcula que, com as devidas correções, o piso está fixado em R$ 1597,87.

Governo e trabalhadores concordam que o parâmetro para o reajuste é o que prevê a Constituição Federal: a definição do custo por aluno estabelecido pela Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, a Lei do Fundeb. Entretanto, discordam sobre a partir de que data deva incidir o percentual de reajuste.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

A Tirania das Organizações Sem Estrutura
Artigo de Jo Freeman, 1970
Durante os anos em que o movimento feminista se formava, dava-se grande ênfase ao que se chamava de grupos sem estrutura, sem liderança, como a forma principal do movimento. Essa idéia tinha origem numa reação natural contra a sociedade superestruturada na qual a maioria de nós se encontrava, no controle inevitável que isso dava a outros sobre nossas vidas e no elitismo persistente da esquerda e de grupos similares entre aqueles que supostamente combatiam essa superestruturação.
A idéia da "ausência de estrutura", no entanto, passou de uma oposição saudável a essas tendências a um dogma. A idéia é tão pouco examinada quanto o termo é utilizado, mas tornou-se uma parte intrínseca e inquestionada da ideologia feminista. Para o desenvolvimento inicial do movimento, isso não importava muito. Ele definiu inicialmente seu método principal como a conscientização e o "grupo de discussão sem estrutura" era um meio excelente para esse fim. Sua flexibilidade e informalidade encorajavam a participação na discussão e o ambiente freqüentemente receptivo promovia a compreensão pessoal. Se nada de mais concreto que a compreensão pessoal resultasse desses grupos, isso não importava muito, porque seu propósito, na verdade, não ia além disso.
Os problemas básicos não apareceram até que grupos de discussão individuais exauriram as potencialidades da conscientização e decidiram que queriam fazer algo mais específico. Neste ponto, eles normalmente se atrapalhavam porque a maioria dos grupos não estava disposta a mudar sua estrutura na medida em que mudava sua tarefa. As mulheres tinham comprado totalmente a idéia de "ausência de estrutura" sem perceber as limitações de seus usos. As pessoas tentavam usar o grupo "sem estrutura" e a reunião informal para fins para os quais não eram apropriados, acreditando cegamente que quaisquer outros meios seriam simplesmente opressivos.
Se o movimento quiser avançar além desses estágios elementares de desenvolvimento, ele deverá livrar-se de alguns de seus preconceitos sobre organização e estrutura. Nenhum dos dois tem nada de intrinsecamente ruim. Eles podem e freqüentemente são mau usados, mas rejeitá-los de antemão porque são mau usados é nos negar as ferramentas necessárias ao nosso desenvolvimento ulterior. Precisamos entender porque a "ausência de estrutura" não funciona.
Estruturas formais e informais
Ao contrário do que gostaríamos de acreditar, não existe algo como um grupo "sem estrutura". Qualquer grupo de pessoas de qualquer natureza, reunindo-se por qualquer período de tempo, para qualquer propósito, inevitavelmente estruturar-se-á de algum modo. A estrutura pode ser flexível, pode variar com o tempo, pode distribuir entre os membros do grupo as tarefas, o poder e os recursos de forma igual ou desigual. Mas ela será formada a despeito das habilidades, personalidades e intenções das pessoas envolvidas. O simples fato de que somos indivíduos com aptidões, predisposições e experiências diferentes torna isso inevitável. Apenas se nos recusamos a nos relacionar ou interagir em qualquer base poderemos nos aproximar da "ausência de estrutura" e essa não é a natureza de um grupo humano.
Isso significa que lutar por um grupo "sem estrutura" é tão útil e tão ilusório quanto almejar uma reportagem "objetiva", uma ciência social "desprovida de valores" ou uma economia "livre". Um grupo de "laissez-faire" é quase tão realista quanto uma sociedade de "laissez-faire"; a idéia se torna uma dissimulação para que o forte ou o afortunado estabeleça uma hegemonia inquestionada sobre os outros. Essa hegemonia pode facilmente ser estabelecida porque a idéia da "ausência de estrutura" não impede a formação de estruturas informais, apenas de formais. Da mesma forma, a filosofia do "laissez-faire" não impedia os economicamente poderosos de estabelecer controle sobre os salários, preços e a distribuição dos bens; ela apenas impedia o governo de fazê-lo. Assim, a "ausência de estrutura" torna-se uma forma de mascarar o poder e no movimento feminista é normalmente defendida com mais vigor pelos mais poderosos (estejam eles conscientes de seu poder ou não). As regras sobre como as decisões são tomadas são conhecidas apenas por poucos e na medida em que a estrutura do grupo permanece informal, a consciência do poder é impedida por aqueles que conhecem as regras. Quem não conhece as regras e não é escolhido para iniciação deve permanecer confuso ou sofrer de desilusões paranóicas de que algo que não sabe bem o que é está acontecendo.
Para que todas as pessoas tenham a oportunidade de se envolver num dado grupo e participar de suas atividades, é preciso que a estrutura seja explícita e não implícita. As regras de deliberação devem ser abertas e disponíveis a todos e isso só pode acontecer se elas forem formalizadas. Isto não significa que a normalização de uma estrutura de grupo irá destruir a estrutura informal. Ela normalmente não destrói. Mas impede a estrutura informal de ter o controle predominante e torna disponível alguns meios de atacá-la. A "ausência de estrutura" é organizacionalmente impossível. Nós não podemos decidir se teremos um grupo estruturado ou sem estrutura, apenas se teremos ou não um grupo formalmente estruturado. Assim, a expressão "sem estrutura" não será mais usada, a não ser para referir-se à idéia que representa. O termo inestruturado referir-se-á àqueles grupos que não foram deliberadamente estruturados de uma forma particular. O termo estruturado referir-se-á àqueles que o foram. Um grupo estruturado tem sempre uma estrutura formal e pode também ter uma estrutura informal. Um grupo inestruturado tem sempre uma estrutura informal ou disfarçada. É esta estrutura informal, particularmente em grupos inestruturados, que fornece o fundamento para as elites.
A natureza do elitismo
"Elitista" é, provavelmente, a palavra mais abusada no movimento de liberação das mulheres. É usada com freqüência, mas nunca de forma correta. No movimento, ela normalmente se refere a indivíduos, ainda que suas atividades e características pessoais divirjam enormemente. Um indivíduo, enquanto indivíduo, nunca pode ser uma "elite" porque o termo "elite" só se aplica adequadamente a grupos. Nenhum indivíduo, independente de quão notório seja, pode ser uma elite.
De uma forma mais apropriada, uma elite refere-se a um pequeno grupo de pessoas que tem poder sobre um grupo maior do qual faz parte, normalmente sem responsabilidade direta sobre ele e, freqüentemente, sem seu conhecimento ou consentimento. Uma pessoa torna-se elitista por tomar parte ou defender o domínio deste pequeno grupo, seja esta pessoa bem conhecida ou totalmente desconhecida. Notoriedade não é uma definição de elitista. As elites mais traiçoeiras são normalmente comandadas por pessoas totalmente desconhecidas do grande público. Elitistas inteligentes são, em geral, espertos o suficiente para não se deixarem tornar muito conhecidos. Quando eles são conhecidos eles são vigiados e a máscara que esconde seu poder não fica mais firmemente presa.
O fato das elites serem informais não significa que sejam invisíveis. Num encontro de qualquer grupo pequeno, qualquer um com um olhar aguçado e um ouvido atento sabe dizer quem está influenciando quem. Os membros de um grupo de amigos confiarão mais nas pessoas do seu grupo do que nas outras. Eles ouvem mais atentamente e interrompem menos. Eles repetem os argumentos dos outros membros e cedem amigavelmente. Os "de fora", eles tendem a ignorar ou enfrentar. A aprovação dos "de fora" não é necessária para se chegar a uma decisão; no entanto, é necessário para os "de fora" manter uma boa relação com os "de dentro". É claro que as linhas não são tão bem definidas quanto as que eu tracei. Elas tem nuances de interação, não são roteiros pré-concebidos. Mas elas são discerníveis e têm o seu efeito. Quando se sabe quem é importante consultar antes da decisão ser tomada e a aprovação de quem é garantia de aceitação, então se sabe quem está mandando.
As elites não são conspirações. Dificilmente um pequeno grupo de pessoas se reúne e tenta tomar o grupo maior para seus próprios fins. As elites são, nada mais, nada menos, que um grupo de amigos que coincidem em participar das mesmas atividades políticas. Eles provavelmente manteriam sua amizade, participassem ou não dessas atividades políticas; e participariam das atividades, mantivessem ou não sua amizade. É a coincidência destes dois fenômenos que cria elites em qualquer grupo e as torna tão difíceis de serem destruídas.
Esses grupos de amigos funcionam como redes de comunicação à parte de quaisquer canais regulares para comunicação que possam ter sido estabelecidos pelo grupo. Se nenhum canal foi estabelecido, eles funcionam como as únicas redes de comunicação. Porque são amigas, normalmente partilhando os mesmos valores e posições, porque conversam socialmente entre si e se consultam quando as decisões comuns têm de ser tomadas, as pessoas que participam dessas redes têm mais poder no grupo que aquelas que não participam. E são raros os grupos que não estabelecem redes de comunicação informal por meio dos amigos que fazem neles.
Alguns grupos, dependendo de seu tamanho, podem ter mais do que uma dessas redes informais de comunicação. As redes podem até sobrepor-se. Quando apenas uma rede dessas existe, ela é a elite de um grupo que seria de outra forma inestruturado — queiram os seus participantes ser elitistas ou não. Se ela é a única dessas redes num grupo estruturado, ela pode ser ou não uma elite, dependendo da sua composição e da natureza da estrutura formal. Se existem duas ou mais dessas redes de amigos, elas podem competir pelo poder dentro do grupo, formando assim facções, ou uma delas pode deliberadamente abandonar a competição deixando a outra como elite. Num grupo estruturado, duas ou mais dessas redes de amizades normalmente competem entre si pelo poder formal. Essa é, em geral, a situação mais saudável. Os outros membros estão na posição de arbitrar entre os dois competidores pelo poder e são assim capazes de colocar exigências do grupo àqueles a quem deram uma confiança temporária.
Muitos critérios diferentes foram usados pelo país, uma vez que os grupos do movimento não decidiram concretamente quem deve exercer o poder dentro deles,. Com o passar do tempo, à medida que o movimento mudou, o casamento tornou-se um critério menos universal para a participação efetiva, embora todas as elites informais ainda estabeleçam padrões pelos quais apenas as mulheres que possuem certas características materiais ou pessoais podem participar. Os padrões freqüentemente incluem: origem de classe média (apesar de toda retórica sobre a relação com a classe operária), ser casada, não ser casada, mas viver com alguém, ser ou fingir ser lésbica, ter entre 20 e 30 anos, ter formação universitária ou, pelo menos, alguma passagem pela universidade, ser "descolada"; não ser muito "descolada", seguir uma certa linha política ou se identificar como "radical", possuir certos traços de personalidade "femininos", como ser "gentil", vestir-se adequadamente (seja no estilo tradicional, seja no anti-tradicional), etc. Existem também algumas características que quase sempre estigmatizariam a mulher como "desviante", uma pessoa com a qual não se deve relacionar. Elas incluem: ser velha demais, trabalhar período integral (principalmente se está ativamente dedicada à "carreira professional"), não ser "gentil" e ser declaradamente solteira (ou seja, nem heterossexual, nem homossexual).
Outros critérios poderiam ser incluídos, mas eles têm todos temas comuns. O pré-requisito característico para participar das elites informais do movimento e, portanto, para exercer o poder, diz respeito à origem, à personalidade e à disponibilidade de tempo. Eles não incluem a competência , a dedicação ao feminismo, a posse de talentos ou a contribuição potencial ao movimento. Os primeiros, são critérios que normalmente se usa para escolher os amigos. Os últimos, são critérios que qualquer movimento ou organização tem de usar se pretende ser politicamente eficaz.
Embora essa dissecação do processo de formação de elites em grupos pequenos tenha sido crítico em suas perspectivas, ele não foi feito com a crença de que essas estruturas informais são inevitavelmente ruins, apenas que são inevitáveis. Todos os grupos criam estruturas informais como resultado dos padrões de interação entre os membros. Essas estruturas informais podem fazer coisas úteis. Mas apenas grupos inestruturados são totalmente governados por elas. Quando elites informais estão juntas com o mito da "ausência de estrutura", não há meios de pôr limites ao uso de poder. Ele se torna caprichoso.
Isto tem duas conseqüências potencialmente negativas das quais deveríamos estar conscientes. A primeira é que a estrutura informal de deliberação será como uma "irmandade" , na qual se escuta as pessoas porque se gosta delas e não porque dizem algo significativo. Enquanto o movimento não faz coisas significativas, isso não importa muito. Mas para que seu desenvolvimento não pare numa etapa preliminar, ele deve alterar essa tendência. A segunda conseqüência é que as estruturas informais não têm obrigação de ser responsáveis pelo grupo como um todo. Seu poder não lhes foi dado; não pode ser tirado. Sua influência não se baseia no que fazem pelo grupo; portanto elas não podem ser diretamente influenciadas pelo grupo. Isso não torna necessariamente as estruturas informais irresponsáveis. Aqueles que se interessam em manter sua influência normalmente tentarão ser responsáveis. O grupo apenas não pode obrigar essa responsabilidade; ele depende dos interesses da elite.
As "estrelas"
A "idéia" da "ausência de estrutura" causou o aparecimento de "estrelas". Vivemos numa sociedade que espera que grupos políticos tomem decisões e escolham pessoas que articulem essas decisões para o público em geral. A imprensa e o público não sabem como escutar seriamente as mulheres enquanto indivíduos; eles querem saber como o grupo se sente. Apenas três técnicas foram desenvolvidas para estabelecer a opinião de grandes grupos: o voto ou o referendo, o questionário de pesquisa de opinião pública e a seleção, num encontro apropriado, de porta-vozes do grupo. O movimento de liberação das mulheres não tem usado nenhuma dessas técnicas para se comunicar com o público. Nem o movimento como um todo, nem a maioria dos grandes grupos dentro dele estabeleceram meios de explicar suas posições sobre os vários assuntos. Mas o público está condicionado a procurar porta-vozes.
Apesar de não ter conscientemente escolhido porta-vozes, o movimento lançou muitas mulheres que chamaram a atenção do público por diversas razões. Essas mulheres não representam um grupo particular ou uma opinião estabelecida; elas sabem disso e normalmente o dizem. Mas porque não há porta-vozes oficiais nem qualquer corpo deliberativo que a imprensa possa entrevistar, quando ela quer saber a posição do movimento sobre um dado assunto, essas mulheres são tomadas como porta-vozes. Assim, queiram ou não, goste o movimento ou não, por omissão, as mulheres com distinção pública são colocadas no papel de porta-vozes.
Essa é uma das origens do que normalmente se sente das mulheres consideradas "estrelas". Já que elas não foram escolhidas pelas mulheres do movimento para representar as posições do movimento, elas se ofendem quando a imprensa pressupõe que elas falam pelo movimento… Assim, o combate às "estrelas", na verdade, encoraja precisamente o tipo de irresponsabilidade individual que o movimento condena. Ao expulsar uma companheira sob a pecha de "estrela", o movimento perde qualquer controle que possa ter tido sobre a pessoa, que se torna livre para cometer todo tipo de pecado individualista de que foi acusada.
Impotência política
Grupos inestruturados podem ser muito eficazes para fazer as mulheres falarem sobre suas vidas, mas eles não são muito bons para fazer as coisas acontecerem. A não ser que o modo de operação mude, os grupos tropeçam quando chega o momento em que as pessoas se cansam de "apenas conversar" e querem fazer algo mais. Uma vez que o movimento como um todo, na maioria das cidades, é tão inestruturado quanto os grupos de discussão individuais, ele não é muito mais eficaz em tarefas específicas do que os grupos separados. A estrutura informal está raramente suficientemente junta ou suficientemente em contato com as pessoas para ser capaz de operar eficazmente. Assim, o movimento gera muita emoção e poucos resultados. Infelizmente, as consequências de toda essa emoção não são tão inócuas quanto os resultados e a vítima é o próprio movimento.
Alguns grupos que não envolvem muitas pessoas e trabalham em pequena escala, tornaram-se projetos de ação local. Mas essa forma restringe a atividade do movimento ao nível local. Além disso, para funcionarem bem, os grupos precisam normalmente se reduzir àqueles grupos informais de amigos que tocavam as coisas. Isto impede muitas mulheres de participarem. Enquanto a única forma de participação no movimento for a filiação a um pequeno grupo, aquelas mulheres que não aderem estão em evidente desvantagem. Enquanto os grupos de amizade forem o principal meio de atividade organizacional, o elitismo se torna institucionalizado.
Para aqueles grupos que não conseguem encontrar um projeto local ao qual se dedicar, o mero ato de estar junto torna-se a razão de estar junto. Quando um grupo não tem uma tarefa específica (e a conscientização é uma tarefa), as pessoas voltam suas energias para o controle de outras pessoas do grupo. Isto não é feito tanto por um desejo maligno de manipular os outros (embora às vezes o seja) quanto pela falta de alguma coisa melhor para fazer com seus talentos. Pessoas hábeis com tempo disponível e uma necessidade de justificar seus encontros se empenham no controle pessoal e gastam seu tempo criticando as personalidades dos outros membros do grupo. Disputas internas e jogos de poder pessoais tomam conta do dia. Quando um grupo está envolvido numa tarefa, as pessoas aprendem a conviver com os outros como são e a desprezar antipatias em benefício de objetivos maiores. Há limites colocados à compulsão de moldar cada pessoa à concepção que se tem do que deve ser.
O fim da conscientização deixa as pessoas sem direção e a falta de estrutura as deixa sem meios de chegar lá. As mulheres do movimento ou se voltam para si mesmas e suas companheiras ou buscam outras alternativas de ação. E há poucas alternativas disponíveis. Algumas mulheres simplesmente "fazem suas próprias coisas". Isso pode levar a um grande grau de criatividade individual que pode, em grande parte, ser útil ao movimento, mas não é uma alternativa viável para a maioria das mulheres e certamente não promove um espírito de esforço cooperativo de grupo. Outras mulheres abandonam inteiramente o movimento porque não querem desenvolver um projeto pessoal e não encontraram meios de descobrir, associar-se ou começar projetos de grupo que as interessem.
Muitas se voltam para outras organizações políticas para dar-lhes o tipo de atividade estruturada e eficaz que elas não conseguiram encontrar no movimento das mulheres. Dessa forma, essas organizações políticas que vêm a liberação das mulheres como apenas uma questão entre outras, consideram o movimento de liberação um vasto manancial para o recrutamento de novos membros. Essas organizações não precisam se "infiltrar" (embora isso não exclua que o façam). O desejo de uma atividade política significativa gerado pelas mulheres ao se tornarem parte do movimento de liberação é suficiente para torná-las ansiosas de entrarem em outras organizações. O próprio movimento não permite nenhum tipo de vazão para suas novas idéias e energias.
Aquelas mulheres que entram em outras organizações políticas e permanecem no movimento de liberação das mulheres ou que entram no movimento de liberação e permanecem em outras organizações políticas, tornam-se, por sua vez, pontos de apoio para novas estruturas informais. Essas redes de amizade se baseiam mais nas suas políticas comuns não-feministas que nas características discutidas anteriormente; no entanto, a rede opera praticamente da mesma forma. Já que essas mulheres partilham valores, idéias e orientações políticas comuns, elas também se tornam elites irresponsáveis, não escolhidas, não planejadas e informais — pretendam sê-las ou não.
Essas novas elites informais são freqüentemente sentidas como ameaças pelas velhas elites informais estruturadas anteriormente a partir de outros movimentos. Trata-se de um sentimento justificado. Essas redes politicamente orientadas dificilmente estão dispostas a ser meras "irmandades" como eram muitas das antigas e querem fazer proselitismo de suas idéias políticas e feministas. Isso é natural, mas as implicações disso para o movimento de liberação das mulheres nunca foram adequadamente discutidas. As velhas elites dificilmente estão dispostas a discutir abertamente essas diferenças de opinião porque isso implicaria em expor a natureza da estrutura informal do grupo. Muitas dessas elites informais tem se escondido sob a bandeira do "anti-elitismo" e da "ausência de estrutura". Para combater efetivamente a competição de outra estrutura informal, elas teriam que tornar-se "públicas" e essa possibilidade é temida por suas inúmeras implicações perigosas. Assim, para manter seu próprio poder, torna-se mais fácil racionalizar a exclusão dos membros da outra estrutura informal por meios como o "combate aos vermelhos", o "combate às lésbicas" ou o "combate às heteros". A única outra alternativa é estruturar o grupo formalmente de tal maneira que o poder original seja institucionalizado. Isso nem sempre é possível. Se as elites informais forem bem estruturadas e tiverem exercido uma boa quantidade de poder no passado, tal tarefa é viável. Esses grupos têm uma história de atividade política relativamentente eficaz na qual a firmeza da estrutura informal se mostrou um substituto adequado à estrutura formal. A sua estruturação não altera muito sua operação, embora a institucionalização da estrutura de poder abra espaço para a contestação formal. Normalmente, são os grupos que mais necessitam de estrutura, os menos capazes de criá-la. Suas estruturas informais não foram bem formadas e a adesão à ideologia da "ausência de estrutura" as faz relutantes em mudar de estratégia. Quanto mais inestruturado um grupo é, tanto mais carece de estruturas formais; quanto mais adere a uma ideologia de "ausência de estrutura", mais vulnerável está a ser tomado por um grupo de companheiras oriundas de organizações políticas.
Uma vez que o movimento como um todo é tão inestruturado quanto a maioria dos grupos que o constitui, ele é igualmente suscetível à influência indireta de outras organizações. Mas o fenômeno manifesta-se diferentemente. Num nível local, a maior parte dos grupos consegue operar autonomamente mas apenas os grupos que conseguem organizar uma atividade no nível nacional podem ser considerados grupos nacionalmente organizados. Assim, são as organizações feministas estruturadas que em geral fornecem as direções nacionais para as atividades feministas e essas direções são determinadas pelas prioridades dessas organizações. Grupos como a "Organização Nacional das Mulheres" e a "Liga de Ação pela Igualdade das Mulheres" e algumas convenções feministas de esquerda são as únicas organizações capazes de montar uma campanha nacional. Os inúmeros grupos inestruturados de liberação das mulheres podem escolher se vão apoiar ou não as campanhas nacionais, mas são incapazes de organizar uma campanha elas próprias. Dessa forma, seus membros se tornam as tropas sob a liderança das organizações estruturadas. Eles não têm sequer os meios de decidir quais devem ser as prioridades.
Quanto mais inestruturado um movimento é, menos controle ele tem sobre as direções na qual se desenvolve e sobre as ações políticas na qual se engaja. Isso não significa que suas idéias não vão se espalhar. Dado um certo grau de interesse dos meios de comunicação e condições sociais favoráveis, as idéias poderão ser difundidas amplamente. Mas o fato das idéias serem difundidas não implica que serão implementadas; significa apenas que serão discutidas. Na medida em que podem ser aplicadas individualmente, elas podem ser realizadas, mas na medida em que requerem poder político coordenado para ser implementadas, elas não o serão.
Enquanto o movimento de liberação das mulheres permanece dedicado a uma forma de organização que enfatiza os pequenos e inativos grupos de discussão entre amigas, os piores problemas da inestruturação não se farão sentir. Mas esse estilo de organização tem seus limites; é politicamente ineficiente, excludente e discriminatório quanto às mulheres que não estão ou não podem estar ligadas a redes de amigas. Aquelas que não se enquadram no esquema existente por motivo de classe, raça, profissão, casamento, maternidade ou personalidade serão inevitavelmente desencorajadas de tentar participar. Aquelas que se encaixam desenvolverão interesses dissimulados de manter as coisas como estão.
Os interesses dissimulados dos grupos informais serão mantidos pelas estruturas informais que existem e o movimento não terá meios de determinar quem deve exercer o poder nele. Se o movimento continua, deliberadamente, a não escolher quem deve exercer o poder, ele termina por não abolir o poder. Tudo que faz é abdicar o direito de exigir daquele que exerce o poder e a influência que tenha responsabilidade por esse poder e essa influência. Se o movimento continua a manter o poder tão difuso quanto possível porque sabe que não pode exigir responsabilidade daquele que o tem, ele impede qualquer grupo ou pessoa de dominá-lo totalmente. Mas, simultaneamente, ele se condena a ser tão ineficaz quanto possível. Um meio-termo entre a dominação e a ineficácia pode e deve ser encontrado.
Esses problemas estão surgindo agora porque a natureza do movimento está mudando necessariamente. A conscientização, como função principal do movimento de liberação das mulheres, está se tornando obsoleta. Devido à intensa publicidade da imprensa nos últimos dois anos e aos inúmeros livros e artigos que circulam agora nos meios estabelecidos, a liberação das mulheres se tornou uma expressão assimilada. Seus temas são debatidos e os grupos de discussão informais são formados por pessoas que não têm conexão explícita com nenhum movimento. O trabalho puramente educacional não é mais uma necessidade imperativa. O movimento deve continuar com outras tarefas. Ele precisa agora estabelecer suas prioridades, determinar suas finalidades e perseguir seus objetivos de maneira coordenada. Para fazê-lo ele deve organizar-se localmente, regionalmente e nacionalmente.
Princípios da estruturação democrática
A partir do momento em que o movimento não se prende mais tenazmente à ideologia da "ausência de estrutura" ele estará livre para desenvolver aquelas formas de organização que melhor se adequam ao seu funcionamento saudável. Isto não significa que devemos ir ao outro extremo e cegamente imitar as formas tradicionais de organização. Mas nós também não devemos cegamente rejeitá-las. Algumas técnicas tradicionais mostrar-se-ão úteis, ainda que imperfeitas; outras nos darão idéias sobre o que devemos fazer para obter certos fins com custos mínimos para as pessoas no movimento. Na maior parte dos casos, nós teremos que experimentar com formas diferentes de estruturação e desenvolver uma variedade de técnicas para usar em situações variadas. O "sistema de sorteio" é uma dessas idéias que emergiram do movimento. Ele não é aplicável a todas situações mas é útil em algumas. Outras idéias para a estruturação são necessárias. Mas antes que procedamos na experimentação inteligente, devemos aceitar a idéia de que não há nada de inerentemente ruim na estrutura em si mesma — apenas no seu uso excessivo.
Enquanto entramos nesse processo de tentativa e erro, existem alguns princípios que podemos ter em mente que são essenciais para a estruturação democrática e que são também politicamente eficazes:
1. Delegação, por meios democráticos, de autoridade específica a indivíduos específicos para tarefas específicas. Deixar pessoas assumirem trabalhos ou tarefas por omissão ou negligência significa apenas que eles não serão feitos de forma segura. Se as pessoas são escolhidas para uma tarefa, preferencialmente após manifestarem um interesse ou vontade de fazê-la, elas assumem um compromisso que não pode ser facilmente ignorado.
2. Exigência de que aqueles a quem a autoridade foi delegada sejam responsáveis frente aqueles que os escolheram. Essa é a forma pela qual o grupo tem controle sobre as pessoas em posições de autoridade. Indivíduos podem exercer o poder, mas é o grupo quem tem a última palavra sobre a forma como o poder é exercido.
3. Distribuição da autoridade entre tantas pessoas quanto possa ser razoavelmente possível. Isso impede o monopólio do poder e exige daqueles em posições de autoridade que consultem muitas outras pessoas no exercício de seu poder. Também oferece a muitas pessoas a oportunidade de ter responsabilidade por tarefas específicas e dessa forma aprender habilidades específicas.
4. Rotação de tarefas entre as pessoas. Responsabilidades que são mantidas durante muito tempo por uma mesma pessoa, formalmente ou informalmente, passam a ser vistas como sua "propriedade" e não são facilmente substituídas ou controladas pelo grupo. Inversamente, se a rotatividade das tarefas é muito freqüente, as pessoas não têm tempo para aprender seu trabalho direito e adquirir o sentimento do trabalho bem feito.
5. Alocação de tarefas segundo critérios racionais. Escolher pessoas para uma posição porque elas são queridas pelo grupo ou lhes dar um trabalho pesado porque não são queridas, prejudica, a longo prazo, o grupo e a pessoa. Habilidade, interesse e responsabilidade têm de ser as principais preocupações nessa seleção. As pessoas devem ter a oportunidade de aprender habilidades que não possuem, mas isso é melhor implementado por uma espécie de programa de "aprendizes" do que pelo método do "ou nada ou afoga". Ter uma responsabilidade maior do que se agüenta pode ser desmoralizante. Inversamente, ser rejeitado naquilo que se faz bem não encoraja ninguém a desenvolver habilidades. As mulheres têm sido punidas por serem competentes por toda história humana. O movimento não precisa repetir esse processo.
6. Difusão de informação a todos com a maior freqüência possível. Informação é poder. O acesso à informação aumenta o poder. Quando uma rede informal dissemina novas idéias e informações entre si, sem passar pelo grupo, ela está envolvida num processo de formação de opinião sem a participação do grupo. Quanto mais se sabe como as coisas funcionam, mais politicamente eficaz se é.
7. Acesso igualitário aos recursos necessários ao grupo. Isto nem sempre é possível, mas deve se lutar para consegui-lo. Um membro que mantenha um monopólio sobre um recurso necessário (por exemplo, uma gráfica ou um laboratório de revelação do marido) pode influenciar indevidamente o uso daquele recurso. Habilidades e informação também são recursos. E as habilidades e informações dos membros só estarão igualmente distribuídos quando os membros quiserem ensinar o que sabem para os outros.
Quando esses princípios são aplicados, eles asseguram que quaisquer estruturas que sejam desenvolvidas serão controladas pelo grupo e assumirão responsabilidades frente a ele. O grupo de pessoas em posição de autoridade será difuso, flexível, aberto e temporário. Eles não estarão numa posição que facilita a institucionalização do seu poder, porque as decisões definitivas serão feitas pelo grupo como um todo. O grupo terá assim o poder de determinar quem deve exercer a autoridade dentro dele.


Centro de Mídia Independente


segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Os hackers da política

Ao invés de apenas lançar críticas contra a crise da representação, um coletivo de ativistas prepara-se para viajar pelo país mostrando à população que é possível apropriar-se de dados do Estado, e interferir sobre eles

Do Blog do Paraná

Para uma nova sociedade conectada, um novo modo de fazer política. É o que propõe o movimento Transparência Hacker. Um coletivo de programadores, estudantes, jornalistas, advogados e ciberativistas que produzem tecnologias sociais para fiscalização, acompanhamento e participação cidadã nas políticas públicas e funções de governo.

Para eles, conectar é possibilitar colaboração, e permitir colaboração é reconstruir a participação democrática no âmbito de Estado ou fora dele; em suma: abrir, por meio da tecnologia, o processo político para a participação de todos. Para dar substância prática a essa pretensão revolucionária, produzem aplicativos e programas a partir de dados governamentais – sempre de modo aberto, fragmentado e colaborattivo – em rede.

Aqui e aqui, reportagens que produzi recentemente sobre o movimento.

Não bastasse o sucesso das recentes iniciativas do coletivo, resolveram se jogar em mais uma empreitada ousada. É “Ônibus Hacker”, que irá rodar o país peregrinando e anunciando o evangelho da nova política conectada. Em cada cidade, o coletivo irá produzir junto com a população soluções participativas para transformar a realidade local. Vale a pena conhecer o projeto (aqui) e apoiar.

Abaixo, entrevista (cerca de 20 minutos) com Pedro Markun, um dos idealizadores do movimento. Na conversa com o jornalista Armando Rollemberg da TV Senado, ele fala entre, outros temas, sobre o que é e o que faz um hacker da política. Imperdível.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Cruzamento de dados demonstra: blogs começam a superar jornais

23 ago

Na última semana uma pesquisa da CNT/Sensus sobre a popularidade da presidenta Dilma Rousseff apurou também a força da blogosfera e das redes sociais. Segundo relatou o Blog do Miro, “dos entrevistados, 16% disseram recorrer “sempre” aos blogs de notícias – cerca de 21 milhões de brasileiros; e 12% disseram recorrer “às vezes” – cerca de 16 milhões”.

Os resultados são positivos e expressivos. Mesmo sem o Plano Nacional de Banda Larga posto em prática, a internet avança pelo país e os blogs começam a firmar-se como fonte de informação. Os 21 milhões de brasileiros recorrendo “sempre” aos blogs de notícias são ainda mais relevantes se lembrarmos que a Associação Nacional de Jornais comemorou recentemente o recorde de circulação de jornais no Brasil, com uma média, no primeiro semestre, de pouco menos de 4,5 milhões circulando diariamente. Costuma-se estimar que cada exemplar seja lido por quatro pessoas. Ou seja, são 18 milhões de leitores de jornais diários contra 21 milhões de brasileiros que recorrem sempre aos blogs para se informar. Esse cruzamento de pesquisas não permite inferir que há mais leitores de blogs do que de jornais, o que não o torna menos significativo.

Certamente não há um blog que possa concorrer com os leitores da Folha de S. Paulo, o jornal de maior circulação, e nem é bom que haja. A lógica da blogosfera não é nem deve ser a concorrência entre os espaços, mas sua complementaridade e mútua alimentação. É justamente nas linkagens, nas referências e nas indicações de lado a lado que todos os blogs noticiosos / políticos crescem juntos. É no crescimento de um que crescem todos, e no crescimento de todos que cresce cada um.

Infelizmente a televisão ainda é totalmente dominante. O entretenimento – sempre alienante, na programação das emissoras de televisão com sinal aberto no Brasil – puxa a audiência dos telejornais. A alienação aberta salva a audiência da manipulação disfarçada de informação. Mas, aos poucos, com o aumento do acesso a computadores particulares, há também a tendência à destinar-se menos atenção à televisão, mesmo que ela esteja ligada. A concentração primária pode passar à tela do computador, aos blogs e às redes sociais.

A tarefa, nesse contexto, é aprimorar as formas de integração entre os blogueiros comprometidos com uma nova comunicação, uma comunicação popular e independente. Também é tarefa fundamental desvincularmo-nos das práticas da mídia tradicional. Para construirmos a transição do velho ao novo modelo de comunicação precisamos primar pela horizontalidade, pluralidade e comprometimento com as causas populares e com a absoluta transparência. Há ainda outras dificuldades e outras tarefas, muitas delas já comentadas em outros posts aqui mesmo do Jornalismo B. Estamos avançando. É hora de aprofundar e radicalizar esses avanços.


Fonte: Jornalismo B

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

O mundo paralelo de Christiani

A lagoa era linda, com margens gramadas e águas amarelinhas, de onde saltavam dezenas de peixes e torradeiras

Por Daniel Cariello, de Chéri à Paris

Estávamos na porta de Christiania, a célebre cidadela hippie de Copenhaguen, onde artistas, vagabundos, poetas, marginais, traficantes, hippies e todo tipo de alternativo convivem harmonicamente há 40 anos como se o sonho sessentista de paz & amor & drogas nunca tivesse deixado de existir.

Antes de passarmos a barreira, lembrei-me do aviso de um amigo: “Velho, Cristiania é um mundo paralelo. Ali você acessa uma outra dimensão, uma realidade muito diferente da nossa. Não é pra iniciantes, fica ligado”.

Entramos um pouco apreensivos e prendemos o ar. Mas logo percebemos que meu amigo havia exagerado. Tudo parecia completamente normal. O céu era esverdeado, como em qualquer lugar do mundo. E a chuva de purpurinas em forma de coração não era forte o bastante para incomodar. É verdade que estranhei um pouco um sujeito vestido de Charles Chaplin que andava plantando bananeira, mas o cachorro rosa ao meu lado me tranquilizou, garantindo que o cidadão só caminhava daquele jeito porque se sentia um pouco indisposto.

Na rua principal, comerciantes de alimentos e plantas ali mesmo produzidos dividiam espaço com enormes placas informando que era proibido tirar fotos e tocar balalaika. Fiquei tão absorvido lendo o informe que quase fui atropelado por um elefante distraído. Não posso reclamar, e culpa era minha, eu estava fora da faixa e não respeitei a preferência do bicho.

Um pouco mais à frente, um pequeno palco recebia uma banda cover de Black Sabbath. A música estava boa, mas por que um dos músicos estava tocando com uma cadeira de balanço no lugar da guitarra? Comentei o fato com um carinha ao meu lado e ele não sabia a razão. O engraçado é que ele era a cara do Ozzy Osbourne. Não só ele, aliás, mas todas as outras pessoas da platéia. Teve um momento em que todo mundo se virou pra mim, fez o símbolo do heavy metal e gritou um sonoro “yeah!”. Eu berrei um “yeah!” de volta. Daí foi um pulo pra cantarmos Paranoid em coro.

Continuamos nossa peregrinação pelo lugar, sempre tomando cuidado para desviar das poças de areia movediça e dos malditos aviões que insistiam em passar dando rasantes nas nossas cabeças, e chegamos a uma lagoa. Era linda, com suas margens gramadas, sua pequena ponte ligando a uma ilhota e suas águas amarelinhas, de onde saltavam dezenas de peixes e torradeiras. Paramos uns minutos pra relaxar e aproveitar a paisagem.

Cansados da peregrinação, decidimos que o momento da cerveja era chegado. Entramos em um bar curioso, pois havia gelatina no lugar do chão e a única maneira de se locomover era saltando. Entre um pulo e outro, conseguir entrar em fase com um ciclope e perguntei como fazia pra descolar uma bebida. “Nada de mais simples”, ele disse. “Basta entrar naquela fila ali e recitar um ou dois trechos de Goëthe, em alemão”. Escolhi meus preferidos, soltei a voz e solicitei três Carlsberg.

Cervejas acabadas, resolvemos ir embora. Embarcamos na nave estacionada em frente ao bar e eu disse ao comandante Jimi Hendrix o endereço do nosso hotel. Consternado, ele explicou que só poderia nos levar até a fronteira da cidadela, não tinha autorização de passar daquele limite.

É claro que aceitamos a carona de bom grado. Jimi nos deixou na entrada, apertou nossas mãos, tocou fogo na nave e se mandou. Cruzamos a porta de Christiania e soltamos o ar. Ali tivemos certeza de que meu amigo havia inflacionado seu recito, pois aquele lugar nos pareceu muito normal. Pergunta pra Janis Joplin, pro Jim Morrison, pro Andy Wharol, pro Raul Seixas ou pro Timothy Leary, que estavam o tempo todo com a gente.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

SP discute criação do Dia do Orgulho Hétero

A quatro dias da Parada do Orgulho LGBT, um dos maiores eventos da capital paulista, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou hoje a inclusão do projeto que cria o Dia do Orgulho Heterossexual para ser votado em segunda discussão. Ele deve entrar em votação ainda nesta tarde. O texto é do evangélico Carlos Apolinário (DEM), que há três anos é contra a realização da Parada do Orgulho LGBT na Avenida Paulista.


O projeto que cria o Dia do Orgulho Heterossexual, a ser comemorado em todo terceiro domingo de dezembro, tem o apoio de lideranças evangélicas e entrou em regime de urgência para ser votado com o apoio de 28 vereadores. Ítalo Cardoso, líder do PT, se posicionou contra o projeto e pediu a suspensão da sessão.

Por volta do meio-dia, todos os trabalhos estavam paralisados na Câmara por causa da discussão sobre o projeto. O líder do PT diz que nada mais será votado no dia se a proposta de Apolinário não for retirada da pauta - o projeto é o primeiro item da pauta da sessão extraordinária. O dia começa mais uma vez tumultuado no Legislativo paulistano, um dia após o vereador Aurélio Miguel (PR) travar a votação do pacote que concede isenção de R$ 420 milhões para o Corinthians.

domingo, 24 de julho de 2011

As influencias anarquistas do pensamento de Bertrand Russel



Bertrand Russel foi um dos maiores filósofos e matemáticos do século XX, desenvolvendo uma obra e um activismo ímpar ao longo do século em que viveu.

Bertrand Russel simpatizou ao longo de toda a sua vida com o anarquismo, muito embora tenha abraçado a ideia de um Estado Mundial para acabar com as guerras entre as nações. Com a idade de 23 anos, o jovem aristocrata é descrito na sua biografia como alguém com tendências anarquistas.

Russel conhecia o sentido e o significado do anarquismo quando escreve em 1918, pouco antes de ser preso por ter denunciado a legitimidade da I Grande Guerra Mundial, o livro "Roads to Freedom: socialism, anarchism, and syndicalism", onde inclui uma citação de Lao-Tzu:

Production without possession
Action without sel-assertion
Development withou domination


Num fundamentado texto da sua autoria, Russel define o anarquismo como a teoria que se opõe a toda a espécie de governo que resulte de uma imposição à força. A liberdade é o supremo bem do credo anarquista, devendo a liberdade ser entendida como a via mais directa para a abolição de todo o controle forçado sobre os indivíduos pela comunidade. Russel defende que o anarquismo deve ser o ideal último para o qual a sociedade deve continuamente aproximar-se. Aliás, o próprio Russel defende que o anarquismo esta particularmente ajustado em áreas tão diversas como a arte, a ciência, as relações humanas e alegria o gozo de viver.

No entanto, ele confessa que por enquanto, e nos tempos mais próximos, será muito difícil que este sonho se venha a realizar-se. Numa sua obra de juventude "Principles of Social Reconstruction" (1916), ele admite que o Estado e a propriedade são as duas mais poderosas instituições no mundo moderno. Porém, ao mesmo tempo que tenta demonstrar quanto dispensáveis são muitos dos poderes estatais, também aceita a utilidade de outros a fim de evitar a substituição da lei pela força nas relações humanas. "A anarquia primitiva, que antecedeu a lei, era muito pior que a lei", escreve Russel. O Estado teria também, segundo ele, um papel positivo a desempenhar na educação obrigatória, na saúde e na administração da justiça económica.

Apesar das fortes críticas de Bakukine e de Kropotkine contra o Estado, Russel admite que alguma coerção da comunidade deva subsistir sob a forma de lei, assim como o Estado é uma instituição necessária para a realização de certas e limitadas tarefas. Sem o Estado o forte poderia oprimir o fraco. Defendia, de todas as ideologias então referenciadas, o socialismo corporativista (guild socialism), se bem que sempre recordando que "o livre crescimento do indivíduo deva ser o fim supremo de todo o sistema político". Num dos números do jornal anarquista Freedom (fundado por Kropotkine) o livro "Roads to Freedom" de Bertrand Russel é vivamente recomendado, observando que os trabalhos do autor contêm propostas construtivas para o anarquismo.


Russel visitou a Russia no Verão de 1920 onde se encontrou com anarquistas como Emma Godman e Alexander Berkman que lhe apresentaram a cidade de Moscovo e vários leaders bolchevistas. O livro que reúne as suas impressões dessa viagem, "The Practice and Theory of Bolchevism" (1920), inclui já várias observações críticas à situação numa altura em que qualquer crítica à ditadura bolchevista era vista, pela esquerda, como uma traição . Dois anos depois, quando Emma Goldman procurou refúgio político na Grã- Bretanha, foi Russel que fez as necessárias diligências junto do Home Office, garantindo que aquela se comprometia a não desenvolver qualquer forma de anarquismo violento no país. No jantar de boas-vindas em Oxford, a única pessoa a aplaudir os violentos ataques feitos por Goldman ao governo soviético foi Russel. A reportagem do Freedom sobre o acontecimento terminava assim: "Mr. Russel, o filósofo mais acutilante da Inglaterra, proferiu então um discurso onde demonstrava as suas mais firmes convicções anarquistas."


Apesar de tudo, Russel manteve sempre alguma distância para com os anarquistas. Recusou, por exemplo, ajudar Emma Goldman a constituir um comité de ajuda aos prisioneiros políticos russos com o argumento que não via uma alternativa melhor ao governo soviético e que não resultasse ainda em maior crueldade. Escreve então a Goldman o seguinte: "Não vejo a abolição de todos os governos como algo que tenha possibilidade de se realizar nas nossas vidas ou mesmo durante o século XX". Mesmo assim, e depois de constatar a inutilidade da sua tomada de posição, acabou de censurar o tratamento dado pelo governo bolchevista aos seus prisioneiros políticos. E quando Sacco e Vanzetti foram executados, Bertrand Russel não teve dúvidas em afirmar que tinham sido injustamente condenados por motivo das suas opiniões políticas.


As atitudes e as suas afirmações libertárias, bem como toda a sua relutância em seguir à risca as posturas anarquistas resultam da sua singular concepção da humanidade e do universo, e do facto de estar consciente da "falácia naturalística" a que Kropotkine e outros anarquistas não escapavam ao defenderem argumentos baseados na supremacia das leis da natureza, que deviam ser seguidas, mas que na perspectiva de Russel mais não nos levaria que não sermos escravos da própria natureza. Tal não o impedia contudo em reconhecer que "se a Natureza deva ser o nosso modelo, então os anarquistas teriam o melhor dos argumentos. Com efeito, o universo físico está ordenado não porque tenha um governo central mas simplesmente porque todos os seres tudo fazem para assim ser"

Como ateísta e atomista, Russel tem uma sombria concepção da humanidade não obstante as suas esperanças de um mundo melhor. Ele considera que o homem é o resultado de uma "conjugação acidental de átomos" destinada a extinguir-se com a morte do sistema solar. Mas apesar da efémera e acidental posição do ser humano no universo tal não significa que o homem não possa lutar para a melhoria de todos. Só a crença do mais profundo desespero pode construir um mundo melhor.

Como humanista, Russel preocupa-se em lutar pela expansão da liberdade e felicidade humanas. Coisa que não é fácil.

Nos anos 50 e 60 Russel envolve-se mais uma vez com grupos de anarquistas no Comité dos Cem no âmbito da Campanha pelo Desarmamento Nuclear. O velho filósofo bate-se então pela acção directa não-violenta e pela desobediência civil em larga escala

Nos textos de Bertrand Russel perpassa uma forte brisa libertária como se pode ser no seguinte excerto:


"Thought is subversive and revolutionary, destructive and terrible. Thought is merciless to privilege, established institutions and comfortable habits. Thought is anarchic and lawless, indifferent to authority, careless of the well-tried wisdom of the ages".

Fonte: Blog Pimenta Negra

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Prefeito de Araguatins é alvo de ação do MPE por irregularidades em prestação de contas


O MPE protocolou Ação Civil Pública contra o prefeito de Araguatins Francisco da Rocha Miranda devido a irregularidades encontradas em prestação de contas. Mais de R$ 158 mil teriam sido gastos com despesas sem autorização legal.
Da Redação

O Ministério Público Estadual (MPE) se manifestou na Ação Civil Pública contra o Prefeito de Araguatins Francisco da Rocha Miranda, devido a diversas irregularidades encontradas em prestação de contas. Conforme a Ação, de abril a dezembro de 2005 e de janeiro a abril de 2006, foram gastos R$ 158.684,59 (cento e cinquenta e oito mil, seiscentos e oitenta e quatro reais e cinquenta e nove centavos) com despesas de hospedagem e alimentação com ordenamento para realização dessas despesas sem autorização legal.

“Não se pode aceitar que numa cidade que é palco de manchetes das grandes mídias nacionais devido ao descaso com a saúde pública (doença ocular - cegueira) e com a educação (escola funcionando em um bar, escolas sem cadeiras, escolas sem merenda, escolas caindo aos pedaços), o gestor municipal gaste uma quantia com refeições para correligionários e amigos pessoais” citam os Promotores de Justiça na Ação.

Na Ação, a Promotoria de Justiça requer a condenação do gestor por ato de improbidade administrativa. Caso condenado, o réu deverá ressarcir o dano causado ao Município, poderá perder a função pública, ter os direitos políticos suspensos, podendo ainda ser proibido de contratar com o poder público e de receber benefícios. Assinaram a Ação os Promotores de Justiça, Breno Simonassi, Paulo Sérgio Ferreira Almeida e Elison de Souza Medrado.

O bens do Prefeito de Araguatins, Francisco da Rocha Miranda, já estão bloqueados pela Justiça em virtude desta mesma ação.

Verbas Fundeb

Os Promotores de Justiça também requisitaram ao Prefeito, que no prazo de dez dias, apresente documentos relativos a prestação dos recursos repassados pelo Fundeb – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica, referentes ao ano de 2009, tendo em vista notícia crime encaminhada pela Procuradoria da República do Tocantins. Caso o requerimento não seja atendido, o MPE vai propor ação judicial.

(Da Assessoria de Comunicação do MPE)

Islândia: nova Constituição em redes sociai


Depois de vencer crise financeira enfrentando banqueiros, pequeno país inova e busca democracia que supere a representação

Por Paula Thomaz, na Carta Capital

Três anos depois de passar por uma crise financeira que derrubou o primeiro-ministro Geir Haarde, quebrou vários dos bancos nacionais e causou uma queda drástica do valor da moeda local, a Islândia aos poucos tenta se reerguer. E o passo mais incisivo para a volta por cima tem sido a discussão para a criação de uma nova Constituição que dê novos ares à base legal do estado islandês. E com uma grande novidade: esta nova Constituição está sendo discutida via as redes sociais da internet.

Com 320 mil habitantes, o equivalente à cidade brasileira de Vitória (ES), e com dois terços dessa população conectada, a discussão para a nova Constituição islandesa se dá por meio de vídeos do YouTube em tempo real, que mostram os debates do Conselho, fotos no Flickr, pequenas frases no Twitter, no site oficial dos temas (em islandês e em inglês), e no Facebook é que as ideias estão abertas para discussão. Em entrevista à Associated Press, o porta-voz do projeto de revisão constitucional Bernhard Berhildur Morris, disse que é possível registrar a participação da população por todas as redes sociais, “mas principalmente pelo Facebook”.

Os trabalhos para a criação da nova Constituição começaram a partir de um Fórum Nacional em que 950 islandeses passaram a discutir as leis básicas. Daí, gerou-se um relatório com mais de 700 páginas que está sendo analisado pelo Conselho Constitucional Islandês, composto por 25 pessoas, que recorreram às redes sociais para divulgação e recebimento de sugestões do público.

Para Henrique Antoun, especialista em comunicação e transformação política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), “mesmo as pessoas que não estejam diretamente conectadas, pode se fazer representar na medida de seu interesse”. E que o fato de a Islândia ser um país pequeno facilita tudo. “Seria mais complicado em um país com as dimensões do nosso uma discussão dessa. É muito mais discutido do que um projeto que fica à mercê de representantes, deputados, vereadores e senadores. Agora a internet tornou, não obsoleta, mas secundária, essa necessidade de representação. Porque você pode se representar por meio do sistema. E é um sistema que não maquia a participação. Todo mundo que está ali, se sente representado. Todo mundo tem voz”, diz.

Em vias de ser finalizada a participação dos islandeses nas redes, no fim deste mês deve-se ter um documento final para ser submetido a um referendo.

Fica o exemplo da Islândia para países pequenos ou não. “É só uma questão de equacionar o grau de participação e o grau de interesse da transformação (que se quer). Eu acho que a tendência é se radicalizar cada vez mais, porque cada vez mais as pessoas percebem que seus interesses desaparecem na hora dos políticos representá-los. Há um problema sério com a representatividade. É a tal da crise da representatividade, que passa por essa visão limitada de que só a mediação pode realmente representar interesses gerais”, afirma Antoun.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A bunda da África: a bunda que amamos


Enviado por Rubens Pontes



Em Namibia, sudoeste da África, vivem ainda hoje os bosquianos, negros pertencentes a grupos etnicos cujas mulheres são portadoras de uma caracerística genética peculiar, com excessiva acumulação de gordura nos glúteos. Angola, terra dos bantos, foi origem de milhares de escravos deportados para o Brasil; seu dialeto era o quimbundo (Kimbundu) da palavra bunda. Outra tribo africana, os bundus (bunda) se caracterizava igualmente pelo traseiro avantajado de suas mulheres que povoaram eitos e camas dos seus senhores.

A palavra bunda, com que designamos o derrière de homens e principalmente de mulheres, não existe em outra lingua. Trata-se de uma analogia decorrente das africanas que chamavam a atenção pela anatomia que nos encanta na excelente seleção do blogui e que levou poetas como Carlos Drumond de Andrade a reverenciar a bunda num dos seus poemas:

A BUNDA

Carlos Drumond de Andrade

A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.

Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios
Ora - murmura a bunda - esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.

A bunda são duas luas gêmeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadencia mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.

A bunda se diverte
por conta própria. E ama.
Na cama, agita-se. Montanhas
avolumam-se, descem. Ondas batendo
numa praia infinita.

La vai sorrindo a bunda. Vai feliz
na caricia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.
A bunda é a bunda,
rebunda.


Por Walder Rocha.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Discurso por mim pronunciado na Câmara de Vereadores de Araguatins em cerimônia que homenageou o Promotor de Justiça Breno Simonassi

(09 de junho de 2011)


Iniciarei minhas palavras com uma passagem do “Último Discurso” do filme “O Grande Ditador”, de Charles Chaplin: “Desejamos viver para a felicidade do próximo”. Nos nossos dias esse pensamento encarna um ideal que parece haver desaparecido nas brumas do passado. “Viver para a felicidade do próximo” é uma paixão altruísta que parece não caber mais em nossos corações. É urgente a necessidade de boas pessoas. Vivemos em uma época, parafraseando Einstein, em que é mais fácil quebrar um átomo que um preconceito. Contudo, não estamos perdidos, e vamos mais além, venceremos! Temos entre nós pessoas que nos inspiram essa convicção.


Estamos aqui, digo isso em nome dos servidores da Promotoria de Justiça de Araguatins, não para homenagear um herói, o povo que precisa de heróis é um povo incapaz de construir sua própria história. Homenageamos um homem, uma pessoa de coração apaixonado e espírito intenso, uma pessoa em que inteligência e juventude nela se conjugam, uma pessoa que apesar de suas qualidades, que são inúmeras, também erra. Mas não é próprio do ser humano ser perfeito. Se erra é capaz de reconhecer seus erros por ser pessoa de humildade. E isso a põe acima de muitas outras.


São essas pessoas, semelhantes ao nosso Excelentíssimo Promotor de Justiça, muitas vezes inigualáveis, muitas vezes incompreendidas, que se projetam além de suas condições, arriscando-se a viver no infortúnio, para se pôr no lugar do outro e compartilhar com ele de suas dores e alegrias. São essas pessoas que nos inspiram a seguir adiante em busca de um futuro próximo com justiça e bem-estar social, um futuro em que a fome e a desumanidade não encontrem cúmplices nem teto para repousar.

Discurso realizado pelo servidor Jorge Paulo Pontes da Silva, servidor do MPE-TO de Araguatins, em face do recebimento do Título de cidadão Araguatinense ao Promotor de Justiça Breno Simonassi, 09 de junho de 2011.

O sistema prisional no Estado do Tocantins vai mal



Radiografia de delegacias e casas de prisão da capital, Palmas, revela as enormes fendas que parecem minar o sistema prisional do Estado. O levantamento realizado pelo Sindicato dos Policiais Civis do Tocantins (Sinpol-TO) aponta uma série de problemas que emperra a atividade dos servidores e o bom cumprimento do papel para o qual instituições como a Unidade de Regime Semi-Aberto foram criadas. Faltam servidores efetivos, estruturas adequadas que possam garantir maior segurança. Segundo a matéria publicada no órgão oficial de comunicação da polícia civil, “presos e policiais civis dividem o mesmo banheiro; não há alojamento adequado para os policiais e os portões do barracão sequer possuem condições de controlar entrada e saída de pessoal” - referindo-se à Casa Albergue.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Desembargador do TJ/SP dá verdadeira aula de humanismo


Enviado por Fernando Nabi


Abaixo, a decisão do desembargador José Luiz Palma Bisson, do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferida num recurso de agravo de instrumento ajuizado contra despacho de um magistrado da cidade de Marília (SP), que negou os benefícios da justiça gratuita a um menor, filho de um marceneiro que morreu depois de atropelado por uma motocicleta. O menor ajuizou uma ação de indenização contra o causador do acidente pedindo pensão de um salário-mínimo, mais danos morais decorrentes do falecimento do pai. Por não ter condições financeiras para pagar custas do processo, o menor pediu a gratuidade prevista na Lei 1060/50. O juiz, porém, negou-lhe o direito, argumentando que ele não apresentara prova de pobreza e, também, por estar representado no processo por "advogado particular". Eis o relatório de desembargador:

"Que sorte a sua, menino, depois do azar de perder o pai e ter sido vitimado por um filho de coração duro - ou sem ele , com o indeferimento da gratuidade que você perseguia. Um dedo de sorte apenas, é verdade, mas de sorte rara, que a loteria do distribuidor, perversa por natureza, não costuma proporcionar. Fez caber a mim, com efeito, filho de marceneiro como você, a missão de reavaliar a sua fortuna.

Aquela para mim maior, aliás, pelo meu pai - por Deus ainda vivente e trabalhador - legada, olha-me agora. É uma plaina manual feita por ele em pau-brasil, e que, aparentemente enfeitando o meu gabinete de trabalho, a rigor diuturnamente avisa quem sou, de onde vim e com que cuidado extremo, cuidado de artesão marceneiro, devo tratar as pessoas que me vêm a julgamento disfarçados de autos processuais, tantos são os que nestes vêem apenas papel repetido.

É uma plaina que faz lembrar, sobretudo,
meus caros dias de menino, em que trabalhei com meu pai e tantos outros marceneiros como ele, derretendo cola coqueiro - que nem existe mais - num velho fogão a gravetos que nunca faltavam na oficina de marcenaria em que cresci; fogão cheiroso da queima da madeira e do pão com manteiga, ali tostado no paralelo da faina menina. Desde esses dias, que você menino desafortunadamente não terá, eu hauri a certeza de que os marceneiros não são ricos não, de dinheiro ao menos. São os marceneiros nesta Terra até hoje, menino saiba, como aquele José, pai do menino Deus, que até o julgador singular deveria saber quem é. O seu pai, menino, desses marceneiros era. Foi atropelado na volta a pé do trabalho, o que, nesses dias em que qualquer um é motorizado, já é sinal de pobreza bastante. E se tornava para descansar em casa posta no Conjunto Habitacional Monte Castelo, no castelo somente em nome habitava, sinal de pobreza exuberante.

Claro como a luz, igualmente, é o fato de que você, menino, no
pedir pensão de apenas um salário mínimo, pede não mais que para comer. Logo, para quem quer e consegue ver nas aplainadas entrelinhas da sua vida, o que você nela tem de sobra, menino, é a fome não saciada dos pobres. Por conseguinte um deles é, e não deixa de sê-lo, saiba mais uma vez, nem por estar contando com defensor particular. O ser filho de marceneiro me ensinou inclusive a não ver nesse detalhe um sinal de riqueza do cliente; antes e ao revés a nele divisar um gesto de pureza do causídico. Tantas, deveras, foram as causas pobres que patrocinei quando advogava, em troca quase sempre de nada, ou, em certa feita, como me lembro com a boca cheia d'água, de um prato de alvas balas de coco, verba honorária em riqueza jamais superada pelo lúdico e inesquecível prazer que me proporcionou.

Ademais, onde está escrito que pobre que se preza deve procurar somente os advogados dos pobres para defendê-lo? Quiçá no livro grosso dos preconceitos... Enfim, menino, tudo isso é para dizer que você merece sim a gratuidade, em razão da pobreza que, no seu caso, grita a plenos pulmões para quem quer e consegue ouvir. Fica este seu agravo de instrumento então provido; mantida fica, agora com ares de definitiva, a antecipação da tutela recursal. É como marceneiro que voto. José Luiz Palma Bisson - relator sorteado"