Ciclo de debates examina ideias de Rosa Luxemburgo – que convidam a rever, ou mesmo reinventar, pensamento de Marx
Entrevista a Antonio Martins | Imagem: Rolando Astarita
Há cinco anos,
surgiu e cresce, em paralelo a uma crise do capitalismo duradoura e de
final imprevisível, um movimento intelectual surpreendente: a
reabilitação das ideias de Karl Marx. O filósofo alemão, que muitos
desprezaram após a queda do Muro de Berlim, está de volta. Seus livros
são republicados
em todo o mundo, com tiragens e repercussão expressivas. Não raro, sua
importância e contemporaneidade são reconhecidas até mesmo por
publicações conservadoras e por consultores ilustres das grandes finanças globais.
No Brasil, este
resgate pode avançar um pouco mais a partir de hoje (19/3), de maneira
aparentemente paradoxal. Um curso, em São Paulo, examinará a obra de uma
pensadora e militante que se apaixonou pelo marxismo muito jovem, viveu
intensamente sob sua influência e contribuiu para enriquecê-lo – mas
foi esquecida, no século 20, tanto pelo socialismo soviético quanto
pelas correntes hegemônicas entre a esquerda. Estamos falando de Rosa
Luxemburgo.
O curso será conduzido pela filósofa Isabel Loureiro,
provavelmente a principal estudiosa da obra de Rosa Luxemburgo no
Brasil. Autora de diversos livros sobre a líder da Revolução Alemã de
1918 (1 2 3), organizadora de uma vasta coletânea sobre sua obra, em três volumes (1 2 3), Isabel avalia que Rosa tornou-se ainda mais atual, hoje, pelos motivos que a fizeram maldita no passado.
Talvez o primeiro
deles seja um ponto de vista extremamente sofisticado sobre Revolução,
Reformas e Poder. Rosa enxergava a importância (e a beleza…) das
mudanças inesperadas, dos grandes movimentos da História em que as
maiorias desafiam o automatismo enfadonho das relações sociais e viram a
mesa. Mas via estes momentos como a abertura de um longo processo de
mudanças, não como mera oportunidade para instalar novos grupos no poder
de Estado.
Disso derivava seu
grande empenho em construir formas avançadas de democracia. Para
transformar a vida, pensava Rosa, as sociedades precisavam enxergá-la;
deviam superar a alienação, a repetição quase inconsciente de relações
consolidadas ao longo do tempo. Esta lenta conquista de autonomia exige,
é claro, abertura ao debate, à crítica e à polêmica. Por isso, Rosa,
embora aliada a Lênin na luta contra o amortecimento e burocratização do
marxismo, no início do século 20, divergiu abertamente das tendências
centralizadoras do revolucionário russo. Em consequência, “foi posta no
índex dos partidos comunistas”, diz Isabel Loureiro.
Mas esta combinação
de rebeldia contra o capitalismo e desejo de valorizar a autonomia não
fará de Rosa uma autora a ser estudada com atenção especial em nossos
dias? Sua obra não será, de certa forma, um convite a rever a obra de
Marx e reinventar seus sentidos? Isabel pensa que sim. Construiu o curso
que começa hoje buscando recuperar, precisamente, as possíveis
contribuições da marxista assassinada em 1918 a uma época marcada por
reviravoltas na América do Sul, grandes mobilizações da juventude em
todo o mundo e… necessidade de construir alternativas.
Realizado em sessões
semanais (às terças feiras, das 19h às 22h), o curso estende-se até
31/5, dividido em três blocos: I. Rosa Luxemburgo e o Marxismo; II.
Revolução, Democracia e Socialismo; III. A atualidade de ‘A Acumulação
do Capital’ na América Latina e a crítica do Progresso. O programa completo e a ficha de inscrição podem ser acessados no site da Fundação Rosa Luxemburgo,
que promove o curso em sua sede, no bairro de Pinheiros. A participação
é grátis; mas as vagas, limitadas, por exiguidade de espaço.
Na entrevista
abaixo, Isabel Loureiro antecipa a “Outras Palavras” o que espera do
curso. Ela, que dedicou um dos três volumes da coletânea de Rosa à
correspondência trocada com amigos e amantes, frisa: “Pelas cartas,
podemos acompanhar seu doloroso processo de amadurecimento, conflitos
amorosos, desejo de ser feliz, suas reclamações de como a vida política
era desumana, seu grande amor à natureza e suas reflexões sobre arte”.

Isabel
Loureiro: “Rosa tem uma concepção aberta do marxismo. Para ela, Marx
não era uma Bíblia com verdades prontas e imutáveis, mas manancial que
permite levar adiante trabalho de compreensão do mundo contemporâneo”
Pouco mais de um ano
depois de lançar uma coletânea de três volumes sobre a obra de Rosa
Luxemburgo, você prepara um seminário de três meses sobre o tema. Em que
Rosa e sua visão particular do marxismo podem ajudar os novos
movimentos que questionam o capitalismo no século 21?
Essa foi precisamente a
pergunta que me fiz quando comecei a preparar o seminário. Por que,
quase cem anos depois de seu assassinato, voltar a discutir as ideias de
uma revolucionária marxista clássica, formada na cultura humanista
europeia do século 19, cujo mundo desmoronou com a Primeira Guerra
Mundial? A resposta não é evidente. Por que sua interpretação de Marx
ainda hoje é atual? Para começar, Rosa tem uma concepção aberta do
marxismo. No seu entender a teoria de Marx não era uma Bíblia com
verdades prontas e imutáveis que os fieis tinham que seguir sem
questionar, mas um manancial inesgotável que permite levar adiante o
trabalho de compreensão do mundo contemporâneo.
Por isso mesmo, ela
nunca hesitou em criticar as vacas sagradas do marxismo europeu, como
Bernstein e Kautsky, e nem sequer o próprio Marx. Essa independência
intelectual é, para os marxistas – que infelizmente têm uma tendência ao
dogmatismo e à ossificação – uma indicação de que precisam continuar
pesquisando e criando conceitos que permitam dar conta da nova fase da
acumulação do capital e da nova situação em que se encontram as forças
sociais. Além disso, Rosa acrescenta à teoria de Marx algo original,
propriamente seu: a ideia de que as transformações sociais são fruto da
ação autônoma das massas populares que, na luta quotidiana pela
ampliação de direitos e, sobretudo, na luta revolucionária pela
transformação radical da sociedade capitalista, ou seja, no seu processo
de existência real, forjam sua consciência político-social. Em resumo, e
simplificando muito, se queremos mudar o que está aí, devemos agir aqui
e agora, porque a nossa ação é o que pode interromper o curso da
história em direção ao abismo.
Alguns aspectos
centrais que você enxerga no pensamento de Rosa têm muito a ver com a
nova cultura política de autonomia e horizontalidade. Por que você a
identifica com a crítica ao vanguardismo, à burocratização e ao
centralismo?
Esses pontos que você
menciona resumem bem o que opôs Rosa Luxemburgo à social-democracia e ao
bolchevismo e continuam sendo de grande atualidade na cultura da
esquerda. Durante o século 20, Rosa foi posta no índex dos partidos
comunistas devido à sua crítica a Lênin e aos bolcheviques. Foi usada
como ícone revolucionário pelos comunistas da antiga Alemanha Oriental
(RDA), mas suas ideias democráticas e libertárias foram deixadas na
sombra ou censuradas. O stalinismo acusou-a de espontaneísta, de não dar
importância à organização política.
É preciso deixar claro
que Rosa não é contra a organização (afinal ela sempre militou num
partido político), e sim contra uma concepção de partido como vanguarda
de revolucionários profissionais, hierarquicamente separada das massas, e
que leva de fora a consciência às massas informes. Essa crítica era
endereçada tanto à social-democracia, quanto ao bolchevismo. Para Rosa,
que é herdeira do Iluminismo, o verdadeiro líder político é aquele que
esclarece, que destrói a cegueira da massa, que transforma a massa em
liderança, que acaba com a separação entre dirigentes e dirigidos, que
contribui para formar aquilo que ela considera o mais importante
pré-requisito de uma humanidade emancipada: a autonomia intelectual, o
pensamento crítico das massas trabalhadoras. E, por sua vez, a autonomia
intelectual requer a existência de liberdades democráticas: direito de
reunião, associação, imprensa livre, etc. Daí a crítica que Rosa faz aos
bolcheviques por terem eliminado o espaço público, que ela vê como o
único antídoto contra a burocratização do partido e dos sovietes.
No seminário, uma
sessão é dedicada à “dialética entre reforma e revolução”. Algumas das
características mais marcantes da nova cultura é o desejo de produzir
mudanças, ainda que parciais; a recusa a reduzir a política a eleições,
ou mesmo a apostar na revolução como um momento mágico e transcendente,
em que toda a sociedade se transforma. O que Rosa poderia dizer sobre
isso?
Esse é mais um ponto em
que Rosa continua sendo atual. Ela queria uma humanidade em que
houvesse liberdade e justiça social; para isso, era necessário passar do
capitalismo ao socialismo. Porém, essa transição só seria possível com a
mais ampla participação dos de baixo nos assuntos que lhes dizem
respeito, o que significava um longo processo de amadurecimento, de
correção de rota, etc. Daí a necessidade do debate público. A revolução
não consistia na troca de homens no poder, era muito mais que isso, era
todo um processo econômico, social, cultural e, claro, político – isto
é, de tomada do poder pelos trabalhadores, que levaria muito tempo para
se efetivar. Resumindo: no pensamento de Rosa Luxemburgo a ideia de
tomada do poder – revolução como quebra rápida das relações de poder
existentes – não se separa da ideia de mudança estrutural da sociedade, o
que implica mudança de valores, ou seja, uma revolução no longo prazo.
Para ela, as duas coisas precisam ocorrer conjuntamente.
Vivemos num mundo em
que estão abertas janelas tanto para enormes transformações como para
riscos de desumanização inéditos. Estão aí os drones, a tentativa de
controlar a internet e vigiar os cidadãos por meio dela, os sinais de
xenofobia, os grupos nazistas em certos países europeus. “Socialismo ou
barbárie”, uma consigna de Rosa, tem a ver com este futuro tão aberto?
Quando Rosa diz que a
humanidade está perante o dilema “socialismo ou barbárie”, o que ela tem
diante dos olhos é o horror da Primeira Guerra Mundial que, para aquela
geração, foi um cruel divisor de águas. Pela primeira vez, as pessoas
se deram conta de que os avanços tecnológicos podiam ser mortíferos, de
que a modernização capitalista destruiria todos os obstáculos que
aparecessem no caminho de seu avanço infernal. E a esquerda radical
alemã, de que Rosa era uma das lideranças, via no socialismo a única
alternativa capaz de barrar essa descida aos infernos.
Mas, ao mesmo tempo,
ela também se dava conta de que, com a guerra e o chauvinismo, que
haviam engolido as massas trabalhadoras europeias, a luta em prol do
socialismo tinha se tornado infinitamente mais difícil. Acho que podemos
fazer um paralelo com o que se passa hoje. Depois da queda do comunismo
burocrático, parecia que agora sim o terreno estava finalmente livre
para que as ideias socialistas democráticas vingassem. Mas o que vemos é
que, precisamente num momento em que o capitalismo está em crise e
sofre um golpe poderoso, no momento em que constantes e gigantescas
manifestações da população europeia mostram claramente que o capitalismo
chegou ao fim da linha, o que acontece em termos de mudança no rumo de
uma sociedade mais justa, mais igualitária? Absolutamente nada!
Os governantes
continuam fazendo os ajustes pedidos pelo capital financeiro e as
populações vivem num permanente estado de sítio econômico, sem saber o
que o dia de amanhã lhes reserva. Precisamos nos perguntar por que,
precisamente num momento em que caiu a máscara ideológica do
neoliberalismo, a esquerda não consegue aparecer como alternativa. É
necessário rever a história da esquerda institucional europeia para
entender porque isso acontece. E aqui, mais uma vez, Rosa Luxemburgo tem
o que dizer com sua crítica à adesão da social-democracia alemã ao
estado de coisas vigente.
A democracia
institucional está esvaziada e em crise, mas os novos movimentos
reivindicam formas cada vez mais democráticas de decisão — inclusive em
seu próprio interior. De que forma o debate sobre o partido, que opôs
Rosa Luxemburgo a Lênin, no início do século XX, pode informar este
anseio por democracia?
É preciso que fique
claro que Rosa Luxemburgo é contra a abolição da democracia “burguesa”
tal como ocorreu no mundo soviético. O que ela quer é complementar a
liberdade política com a igualdade social. Isso significa que o
pluralismo partidário, a imprensa livre, a liberdade de associação, etc.
devem ser preservados. Rosa era uma marxista clássica, como eu disse,
que tinha uma visão muito crítica dos regimes autoritários do seu tempo,
como o czarismo e o império alemão.
Ao mesmo tempo, também
se deve enfatizar que ela, diferentemente de seu companheiro de partido
Eduard Bernstein, não tem ilusões quanto à democracia burguesa
parlamentar. Ela não acredita na transição ao socialismo pela via
eleitoral. Durante a revolução alemã de 1918, Rosa ficou entusiasmada
com os conselhos de operários e soldados que surgiram no início do
movimento, vendo neles uma forma de ampliar a participação dos de baixo.
Mas não foi muito longe nestas reflexões, pois foi assassinada pouco
tempo depois.
É muito comum que a
esquerda libertária recorra ao exemplo dos conselhos como panacéia que
supostamente resolveria os problemas da democracia representativa. É sem
dúvida uma forma democrática que deve ser preservada, sobretudo no
âmbito local. Mas penso que devemos pensar, como Rosa indicou sem
aprofundar em seu texto de crítica aos bolcheviques escrito na prisão em
1918, que o ideal é combinar mecanismos de democracia representativa
com mecanismos de democracia direta.
Hugo Chávez, símbolo
do “socialismo do século 21″ para parte da esquerda, baseou sua ação
num Estado forte e num comando centralizado. Em contrapartida, os
zapatistas difundem a ideia de ”mudar o mundo sem tomar o poder”,
cunhada por John Holloway. O que o pensamento de Rosa sugeriria, sobre
esta polêmica?
Rosa defende a tomada
do poder de Estado pelos trabalhadores. Nesse sentido, ela se oporia à
fórmula de Holloway. No entanto, ao defender a necessidade da
transformação radical dos valores burgueses-capitalistas na transição ao
socialismo ela percebe que a revolução é um processo muito mais
complicado, lento e doloroso que a simples tomada do poder de Estado. Ao
mesmo tempo, ela não recusa a tomada do poder, vendo aí um meio de
acelerar as mudanças necessárias. Porém, acima de tudo, para Rosa
Luxemburgo, o novo grupo que chega ao poder tem a obrigação de preservar
e/ou construir mecanismos de participação, de formação política, de
criação de autonomia da massa popular e não eliminar os mecanismos
democráticos existentes, como se fossem apenas expressão da dominação
burguesa.
Crescem em todo o
mundo, e em particular no Brasil, os movimentos que criticam a crença
cega no “desenvolvimento”. A tradição marxista mais difundida também é
desenvolvimentista. Materialista, acredita que o “desenvolvimento das
forças produtivas” é anterior aos avanços da consciência. Rosa tem algo a
dizer sobre isso?
Rosa é filha do seu
tempo, e também filha do marxismo do seu tempo. Isso quer dizer que, por
um lado, ela é defensora do desenvolvimento das forças produtivas, ou
seja, da modernização capitalista. Mas, por outro – e isso é
interessante e atual sobretudo para nós da América Latina –, ela também
enfatiza o aspecto sombrio dessa modernização capitalista, com todo o
seu conhecido séquito de horrores: destruição violenta de modos de vida
primitivos pelo capitalismo europeu, a fim de submetê-los aos mecanismos
do mercado; guerra do ópio na China; enriquecimento da metrópole às
custas do endividamento da periferia; acumulação de capital mediante
compras de armas pelo Estado, o que favorece guerras de todos os tipos,
etc. Essa postura avessa ao eurocentrismo e à ideia de que o progresso
da civilização justifica os sofrimentos dos povos periféricos dá-nos
elementos para repensar no que consiste verdadeiramente o progresso e se
o capitalismo é mesmo o horizonte inelutável da humanidade.
De que forma
permanece atual a noção de imperialismo, que era cara a Rosa Luxemburgo?
Como este conceito sobrevive num mundo marcado pelo declínio dos EUA e
Europa, pela ascensão dos BRICS e, ao mesmo tempo, pela difusão, nestes
países, dos modos de vida típicos do capitalismo?
Para Rosa, o
imperialismo não é, como para Lênin, uma “etapa superior do capitalismo”
e sim uma característica do capitalismo desde as origens. Desde o
início, o capitalismo precisou de mercados externos (por exemplo, ao
transformar as economias primitivas em economias de mercado) para se
reproduzir. A violência e o saque das camadas sociais não-capitalistas,
que Marx restringia ao período da chamada “acumulação primitiva”, Rosa
Luxemburgo considera uma característica do capitalismo até sua plena
maturidade
.
Hoje assistimos à
mercantilização de tudo que ainda não foi transformado em mercadoria:
serviços públicos, saúde, educação, cultura, conhecimento, direitos
autorais, recursos ambientais, etc. É precisamente aqui que David
Harvey, ao analisar o novo imperialismo, procede a uma interessante
atualização da teoria de Rosa Luxemburgo, forjando o conceito de
“acumulação por expropriação”. As feministas alemãs, também inspiradas
em Rosa, incluem nesse âmbito o trabalho doméstico feminino. Logo, como
podemos ver, apesar da ascensão dos BRICS, e apesar de algumas
alterações na divisão do mundo entre centro e periferia, a verdade é que
o imperialismo, ainda que novo, vai bem, obrigado.
Um dos três volumes
da coletânea organizada por você trata da vida privada de Rosa, recupera
cartas pessoais, discute sua condição de mulher. Por que este destaque,
pouco comum na literatura marxista?
Antes de mais nada, é
preciso observar que tivemos a sorte de suas cartas terem sido
preservadas praticamente intactas graças à devoção dos amigos. Essa
correspondência é um documento precioso sobre o socialismo alemão e
internacional da época. Mas a minha escolha recaiu sobre as cartas aos
amantes e amigos, pois queria mostrar, pelo exemplo de uma
revolucionária, que mesmo a militância política requer qualidades que
muitas vezes são desprezadas como pequeno-burguesas, ou sei lá o que.
O exemplo de Rosa se
opõe à imagem falsificada do militante como um ser puritano que dedica
24 horas do dia à causa revolucionária. Pelas cartas, podemos acompanhar
seu doloroso processo de amadurecimento, conflitos amorosos, desejo de
ser feliz, suas reclamações de como a vida política era desumana, seu
grande amor à natureza, reflexões sobre arte.
Ela vai se libertando
aos poucos de um relacionamento amoroso que não a satisfazia e se
afirmando como uma intelectual dona do seu nariz, que intervém no espaço
público, que não teme enfrentar as vacas sagradas da social-democracia
alemã, com uma vida privada bastante livre para os valores da época. É
uma personagem muito rica do ponto de vista emocional, uma ótima
escritora, uma pessoa com um amplo espectro de interesses: fala de
pintura, literatura, botânica, geologia, e, sobretudo nas cartas da
prisão, descreve o pouco de natureza que pode enxergar da janela da cela
ou do pátio da prisão com grande sensibilidade e riqueza de detalhes.
As cartas aos amigos eram seu jeito de fugir do cárcere. As cartas da
prisão, publicadas pela primeira vez logo depois do seu assassinato e
republicadas inúmeras vezes, levaram gerações de militantes a se
interessarem por Rosa Luxemburgo. Quem sabe acontece o mesmo com a nossa
coletânea, publicada em 2011 pela Editora UNESP?